Quando ia para o correio era levar a mala com as cartas. Levava-as à Benfeita e trazia as que vinham de Côja, lá de Lisboa, de um lado e de outro. Quem me chamou para lá foi um senhor daqui. Fui eu e vários, quando eu não quis, tiveram que ir outros.
Andei lá a ganhar 15 tostões, era uma vergonha. De Pai das Donas vinha para a Benfeita ganhava 2 escudos. E para aqui, para tão longe, ganhava 15 tostões. Mas isto ia da pessoa, que fazia o ajustamento. A outra pessoa é que ganhava e dava só assim. Tinha 5 tostões de cada terra. Vir da Benfeita aos Pardieiros e dos Pardieiros para a Relva Velha e para aqui. Era uma miséria, quase nem para o pão dava. Até se dizia: “Relva Velha está a cair, Pardieiros estão no chão, Valentões de Monte Frio que ainda cá têm mão.”
Era bastante tempo. Às vezes eram seis horas e eu ainda na Benfeita. Às vezes, quando tocavam as Ave Marias ainda eu estava na Benfeita, que o correio não vinha de Côja. Na igreja tocavam as Ave Marias, já era noite. A pé e tão longe. Debaixo de água, neve e vento, pinheiros a caírem à minha frente. A uma irmã minha caiu-lhe um pinheiro à frente. Se ela calha de passar na altura apanhava com o pinheiro em cima. Vinha de lá, às vezes, de noite “pia cima” e eu tinha tanto medo. Se sentisse só uma pedra, já vinha ali assim com medo. Uma vez, cheguei aos Pardieiros e vai um homenzinho comigo com uma lanterna. E daqui não iam à minha procura, nem iam esperar-me. Ai, eu chegava a casa danada. Vinha por ali acima. Uma vez esqueci-me da mala dos Pardieiros na padaria e tive que voltar da Nossa Senhora das Necessidades, mais para cá, para a Benfeita para ir buscar a mala. Aconteciam-me assim coisitas. Depois é que começou a ser de mota e agora é de carro. Vem de Côja num carro e a gente era a “butes”.