Lembro-me muito bem dos meus pais. O meu pai era Alfredo Nunes. Era de Porto Castanheiro, freguesia da Teixeira. A minha mãe era Maria dos Anjos Henriques. Era de Monte Frio. Conheceram-se por intermédio do meu avô, Manuel Henriques, que era o pai da minha mãe. Andava na Beira Baixa com um negociozinho das especiarias dos enchidos. O meu avô da parte do meu pai também andava com o mesmo negócio nas mesmas terras. E, então, eram amigos uns dos outros, eram como famílias. Visitavam-se. E foi por aí, com certeza, que eles se conheceram.
No Verão, às vezes, quando não havia trabalho, ainda saía. Ia fazer umas feiritas à Covilhã, que é todos os oitos dias, à Feira de São Mateus, uma feira muito antiga em Viseu, e às romarias que faziam por cá: à Senhora das Preces e à Senhora das Necessidades. O meu pai ia ao Sardal comprar colheres de pau. O senhor Zé Francisco é que lhas fornecia. Comprava também fusos e foices de ceifar a erva. Levava o seu cesto, ia fazer aquelas feiras e vendia tudo. Mas a pé, iam a pé!
Também se empregava muito na agricultura, mas na aldeia o meu pai era pedreiro. Fazia paredes e, ajudado, fez os muros da estrada. Aqueles muros que há na estrada para quem vai do Monte Frio para a Portela da Cerdeira e para Côja. Fui muita vez aí levar-lhe o jantar. O jantar, antigamente, era ao meio-dia. Nós, os miúdos que ainda não eram adultos para trabalhar nos campos, já se vê, íamos levar o cestito do jantar aos trabalhadores da aldeia, que lá andavam. Eu ia levar todos os dias o jantar ao meu pai, onde ele andasse a fazer umas paredes. O mais longe que trabalhou foi a chegar para cima da Cerdeira, no muro da estrada. Naquele tempo, ainda não havia estrada para o Monte Frio - a estrada veio a seguir para a aldeia e depois seguiu para o Porto da Balsa - e nós íamos por caminhos.
A minha mãe era doméstica. Trabalhava na fazenda, no cultivo das terras. Mas ainda andou no minério nas Minas da Panasqueira.