Quando eu nasci houve dois anos de fome que foi uma escravidão! O milho secou-se todo e não havia água para regar. As pessoas tinham que ir longe comprar alguma coisa para se comer e para darem aos bichos: a farinha, o milho, o centeio... Não produziam e os alimentos chegavam ao Piódão com racionamento. Então, lembro-me que vinham pobrezinhos pedir. Não eram da aldeia, eram de longe, das outras terras. Mas, quando vinham, a minha mãe dava sempre alguma coisa. Uma ocasião, ela não estava em casa. Tinha ido buscar lenha para cozer o pão. Nesse dia, veio um homem pedir e eu pensei:
- Ora eu não tenho que dar a este senhor...
Disse-lhe então assim:
- Olhe, o senhor não se importava que eu lhe desse uma mão cheia de farinha?
- “Ai eu aceito! Eu aceito! Olhe, é uma grande esmolinha que a menina nos faz!” - disse ele.
E eu dei-lhe. Depois disse para a minha mãe:
- Ó mãe, então veio cá um senhor pedir-me. Eu não tinha que lhe dar, olhe, dei-lhe farinha.
- “Então, fizeste bem! Fizeste bem de lhe dar.” - disse ela.
E eu:
- Olhe, e também lhe dei umas cebolas. Temos cá tantas, também lhe dei.
- “Então, e onde é que ele as levou?” - perguntou a minha mãe.
- Olhe, trazia um saco e eu pus-lhe lá no saco. - respondi-lhe.
Disse a minha mãe assim:
- “Minha menina, tiveste boa lembrança! Olha, quando assim é, que cá venha alguém, tu dás sempre alguma coisa, porque se fossemos nós que andássemos com fome também gostávamos que nos dessem.”