Agora, o Piódão tem todas as condições. Quando eu saí daqui, a estrada só chegava ao Malhadinho. As pessoas não podiam sair daqui. Para saírem, tinham de ir a pé. A minha mãe foi a Arganil muitas vezes a pé. Uma distância de quase 50 quilómetros. Foi daqui quase para a Beira Baixa a pé. São 70 quilómetros por caminho! Por estrada, naturalmente, seria mais. Naquela altura, havia os caminhos. Onde passavam as pessoas, passavam também os cavalos, quem os tinha. Nesse caso eram burros, não eram propriamente cavalos, que são um pouco maiores. O burro é mais pequeno e adaptava-se melhor. Mas nem era bem cavalo nem burro. Era uma outra raça diferente. Uns cavalos mais pequenos e fortes, que se adaptavam muito bem a estes pisos e faziam as cargas, quando as pessoas não as faziam às costas. Era muito diferente do que está agora. Era muito mais sufocante.
As casas não tinham casa de banho. Não havia água canalizada, nem sequer era preciso haver casa de banho. É óbvio. Não havia luz. Nós fazíamos os trabalhos da escola à luz do candeeiro a petróleo. Algumas pessoas já tinham aqueles a gás, vulgo Petromax. Mas isso eram as pessoas mais desafogadas. As pessoas mais pobres era a petróleo. Aquilo era um cheiro, um “pive” todo o dia e toda a noite. Se formos por aí, isto está 100 vezes melhor. Por isso mesmo, agora, sou mais exigente. Naquela altura não precisava de nada. Não havia, mas também não precisava, nem reclamava. Contentávamo-nos com pouco. Isto era tão pobrezinho que a gente contentava-se com pouco.
Agora, na parte dos divertimentos para as crianças, não vejo grande melhoria. Continua a haver uma grande falta. Isso é um facto. Para as pessoas já mais adultas, é óbvio que está muito melhor do que naquela altura. Para as crianças que vêm para aqui de férias, não vejo grandes sítios onde elas se possam divertir. Isto quase que não tem 50 metros direitos. Onde é que eu encontro aí um espaço, sem ser a estrada, onde tenha 50 metros direitinhos? Não tem! O meu miúdo tem 13 anos. Gosta de jogar à bola. Aqui, não tem sítio para jogar à bola. Agora nem sequer tem a piscina fluvial. Esta intempérie levou isto tudo por água abaixo. Que é que ele vem cá fazer? Só se for andar comigo para a serra, mas isso ainda é muito duro para ele. Com 13 anos, não pode fazer aquilo que eu faço. Não pode fazer 90 quilómetros. A menos que eu espere um dia inteiro por ele. A miúda tem 20 anos. Também não encontra aqui grandes divertimentos. Por isso, também não gosta muito. Diga-se em abono da verdade. Por isso, acho que é normal as pessoas não gostarem. Gostam mais as pessoas que vêm cá a primeira vez. As pessoas que já conhecem isto, propriamente, os nossos filhos, não gostam. Entendo perfeitamente.
Não me importaria de dar a minha contribuição para que isso deixasse de acontecer. Assim houvessem mais vontades. As coisas têm de se fazer. Há aí outras terras mais pequenas que esta e já têm algumas valências que o Piódão não tem. Isto magoa-me imenso... E tenho lutado bastante por isso. Actualmente, sou presidente da Comissão de Melhoramentos. Já fui quatro anos e voltei a ser novamente este ano, mas não consegui criar grandes condições para que as coisas se desenvolvessem nesse campo. Acho que já devíamos ter, por exemplo, um ringuezinho de futebol de salão. Vou ficar sempre com isso atravessado. Não conseguimos realizar nem uma piscina como deve de ser. Há coisas que não se compreendem. Mas a primeira coisa que eu fazia era um ringuezinho de futebol. Já que não dá para ter um campo como deve de ser, pelo menos um ringue. E depois uma piscina como deve de ser. Não pode ser com esta água do ribeiro, porque é muito fria. Ninguém consegue tomar banho. Eu tomei muitos anos. E mesmo depois de ir para Lisboa, vinha cá e tomava. Mas agora acho que as pessoas já não estão para aí viradas. O corpo já não está preparado para isso. O próprio músculo estava diferente. Aceitava tudo. Hoje não é assim tão fácil. Há que inovar nesse campo também. Se eu tivesse possibilidades, nem que pagasse do meu bolso... Há determinadas coisas que tinham de ser feitas mesmo.