Andei sempre descalça. Os meus pés nem tinham unhas. Dava uma topada, pumba, criava, andava a sofrer. Queria andar depressa, de maneira que os pezitos é que pagavam. Tenho as unhas dos pés todas amarrotadas, assim mal-ajeitadas. Já no fim de ser mulher, havia aí padeiros, havia aí umas três padarias. Essas terras agora não é nada para o que era, havia aí de tudo. Eu ia levar pão a Fajão, lá para a terra, eu ia a Moura, eu ia a todo o lado da freguesia, levar pão. Coitadinha de mim, um dia, começou a nevar, levava umas tamanquitas, por cima um bocadinho de sola e pau por baixo. Mas a neve assapava-se no pau e eu queria andar e não podia, tive de me descalçar para ir para a Moura. Andar na neve. A minha vida foi muito cruel. Foi mesmo má.