Quando conheci o meu marido eu já tinha 20 anos. Diz assim uma prima minha:
- “Olhe o seu marido vai ser Manuel.”
- O meu marido vai ser Manuel? Olha calha bem, nem cá há Manuel nenhum na terra, e eu rapaz de fora também não conheço nenhum.
Tinha 20 anos e ele foi o primeiro rapaz que eu tive. Eu não tinha vagar para andar nas festas, a mim não me davam vagar para isso. Então, os rapazes não me viam. Eles viam mas tinham medo do meu pai. Mas bem, o que calhou cá veio. Um dia, andava a semear umas batatas, ele veio de Lisboa, mas eu já nem me lembrava aquele rapaz, a mãe morreu tinha ele 3 anos, e coitadinho, depois um primo levou-o para Lisboa, lá o acabou de criar, e depois andava nas obras com ele. Ele veio, ia no caminho, andava eu a semear batatas e pôs o pé em cima de uma travessa e diz ele:
- “Boa tarde!”
- Boa tarde!
Parece-me que nem sequer olhei para ele. Foi assim uma coisa. Sabia que existia um rapaz naquela casa, de pequenino. No ano em que eu nasci foi o ano que morreu a mãe dele, ele já tinha 3 anos e meio ou 4 a mais que eu. E ele disse assim:
- “Arre, que tu nem ao menos olhas para mim!”
- Então não tenho nada de olhar. Para o meu serviço é que eu tenho que olhar.
E diz ele assim:
- “Então estás boa?”
Lá nos cumprimentámos. Mas não liguei. Diz ele assim:
- “Que raça! Olha que pareces de outro reino, nem olhas para as pessoas, nem nada!”
- Olhe é como lhe digo, tenho de fazer a minha vida!
Não liguei. E o rapaz foi-se embora para Lisboa. Encontrou algumas pessoas da minha família e disse-lhes que engraçava, que assim e que assado. Bem, eu não liguei nada. Quando deu-se o caso daí por pouco tempo, vem outra vez à Benfeita, foi no tempo das castanhas. Foi meter à fazenda onde a gente fazia e diz lá:
- “Olhe, venho aqui para fazer o magusto com vocês.”
Ia mais uma rapariga e um rapaz. Já morreram esses dois. Eram um irmão e uma irmã. Mas não eram irmãos dele. E digo eu assim:
- Ai eu não tenho vagar.
- “Que raio, esta mulher nunca tem vagar de nada!”
E eu tinha era medo do meu pai.
- “Bem, vamos fazer o magusto todos.”
- Olha, vocês vão com Deus.
A rapariga chamava-se Palmira.
- Olha, Palmira, eu não posso, que tenho de ir arrecadar aquela lenha toda que está ali para o curral porque pode chover e depois é um caso sério. E tu sabes como é o meu pai.
Foram todos, três que vieram, e três irmãos que estávamos em casa arrecadámos a lenha. No fim da lenha, fomos todos apanhar as castanhas. Fizéramos o magusto, ele avisou os meus pais do magusto, quando vim de lá já era o genro do tio Zé Albano, que o meu pai chamava-se Zé Albano. Bem, aquilo pegou. Dentro de um mês e meio casáramos porque, um dia, estava o meu pai a fazer a barba, vem um outro cliente qualquer e disse assim:
- “Ai não sei, a tua filha anda para casar com o fulano, mas olha que ele só quer casar à moda de Lisboa.”
Bem, ele veio para casa, eu já estava deitada, mas ele começou a conversar com a minha mãe:
- “Não sei o que a rapariga anda a fazer, porque o rapaz só quer casar à moda de Lisboa, não sei o que ela anda a fazer, qualquer dia agarro num burrito que arrume com os dois.”
Chega ao outro dia, digo assim para o meu marido:
- Derivado ao que a gente tem combinado, nada feito.
Ele ia-me caindo aos pés. Ia-me caindo aos pés. Ficou branquinho de todo. E depois eu vim a gostar dele. E diz ele assim:
- “Porquê?”
- Por isto, disseram ao meu pai na barbearia que tu só te queres casar à moda de Lisboa, e eu não sei que moda é. Então se queres casar à moda da Benfeita, vais falar com o padre e vamos casar.