Assentei praça em Aveiro em 1970. De Aveiro fui para Queluz e de lá fui para o Porto Brandão à espera de embarque. Depois fui para a Guiné no dia 24 de Maio de 1971. Estive lá de 1971 a 1973. Estes dois anos na Guiné era conforme calhavam. Uns momentos maus, melhores, outros piores de fome, de sede. Houve de tudo.
Tive lá um episódio, eu e os meus colegas, não fui só eu. Tivemos um problema quando estávamos lá há nove dias. Eram nove horas da noite, fôramos bombardeados pelo inimigo e estivemos 45 minutos debaixo de fogo, deitados no chão. Estava à espera da morte. Não esperava outra coisa ali. Só se via era lume no ar, era metralhadoras era tudo. Também tive bons momentos, mas esses são poucos. A gente lá o coração andava sempre a tremer, nunca andava certo, fosse de noite, fosse de dia. Aquilo nem tem explicação, foram sempre momentos com um bocado de tristeza, um bocado de dor porque uma pessoa não estava certa, não sabia onde havia de estar. Era de noite, era de dia, o pensamento andava sempre, não andava certo. E então só a droga dos comprimidos! Tomávamos aí aos 20 por dia. Sei lá para quê! Só nos davam de manhã, ao meio-dia e à noite. Seis e sete de cada vez! A gente metia aquilo para a boca ao fim ou antes de almoço ou ao fim de jantar, pronto. Era para fazer aquela reacção. Eram tranquilizantes. Aí não havia medo de nada. Nada! Fosse de noite, fosse de dia.
Graças a Deus, tive sempre grandes amigos. Fui sempre bem estimado. Pensava muito aqui nos Pardieiros. O que nos valia era os aerogramas naquele tempo para escrever, mais nada. Não havia outras comunicações. Escrevia quase todos os dias. Era de cá para lá e de lá para cá. Era as saudades que nós tínhamos de não estarmos uns ao pé dos outros, de conversarmos e termos aquela convivência como devia. Na altura já era casado e escrevia para a minha esposa.
Quando voltei, vim para os Pardieiros, dedicar-me à agricultura, à mesma coisa que tinha primeiro.