A Torre da Paz tem um significado muito grande. Em 1944, houve um senhor que pensou em fazer uma homenagem ao Salazar quando terminou a guerra da Europa. Então para fazer isso, essa homenagem, pensou em fazer uma torre com uns sinos. Tem lá um sino que diz: “Este sino tocou pela primeira vez a anunciar o fim da guerra na Europa”.
Em 1944 começaram a torre por ali acima, até que no dia em que acabou a guerra, no dia 7 de Maio, a torre ainda não estava completa.
Havia nesse tempo um relojoeiro, em Almada, que era aqui da freguesia de Pomares, que foi um grande artista de relógios. E fez um relógio adequado. Esse relógio tem um mecanismo, com uma roda que demora uma ano a dar a volta, não parando o relógio. Se parar tem que se acertar. A roda vai andando até que chega, tem um certo ponto, tem uma fendazinha, um gancho que trabalha em cima da roda, quando chega ali ao dia 7 de Maio cai para baixo, levanta a contadeira, a contadeira fica livre e o relógio dá as 1000 e tal badaladas. Tantos dias quanto durou a guerra.
Eu tratei daquele relógio cerca de 60 anos. Desde que ele para ali foi até agora há pouco que já não podia, foi sempre o meu ideal. Tratar do relógio, dar-lhe a corda, limpá-lo, oleá-lo. E então, de vez em quando, quando era no dia 7 de Maio, já não é a primeira vez nem a segunda que aparecem pessoas da SIC e da TVI a perguntar-me informações. Eu, como vivia perto, nasci ali, vi colocar a primeira pedra na torre, acompanhei as obras até ao cimo, e então acompanhei o 7 de Maio.
O 7 de Maio em que o sino deu as primeiras badaladas, ainda estava a torre por acabar. Eu andava na fazenda, vinha com um molho de lenha, e botaram aqui foguetes. Eu não sei se vim pelo ar se vim pelo chão! Sei que peguei no molho e corri. Direito à torre. A torre ainda estava com andaimes. Já estava feita, já estava lá o sino, porque já se previa o fim da guerra e só o relógio é que não estava. Eu fui direito à torre para tocar o sino. Diz o presidente da Junta:
- “Alto! Quem dá as primeiras badaladas sou eu!”
Deu as primeiras badaladas em cima de um andaime.
O sino estava tapado com uma coisa em madeira para não lhe mexerem e então dali até à noite foi sempre tocar o sino, eu e os outros colegas. Depois fomos para uma taberna que aí havia.
E dali para diante, como eu vivia ao pé, tomei conta do relógio e digo com franqueza, hoje tenho pena de não tratar dele, mas já não posso. Mas considerava o relógio como se fosse uma pessoa íntima da minha família. E até que um dia, no dia 7 de Maio, a Junta fez ali um banquete, no largo aonde vieram os arquitectos, engenheiros, etc, e muita gente do povo, e eu era o sineiro, era o que tratava do relógio, foi um dia de fome que eu passei. Porque eu estava sentado na mesa, lá vinha o presidente da Junta:
- “Ó António, tens que ir ao sino. Olha estão aqui os da SIC.”
Lá ia eu. Vinha por ali acima para lhe mostrar o relógio, para lhe explicar. Daí um bocado ia para baixo, sentava-me, outro:
- “Ó António, olha estão aqui de Côja, estão daqui e dali e tal, tens de lá ir.”
E eu, toca de me levantar e ir até ao sino. Foi um dia de fome. Com tanto comer que lá havia, foi um dia de fome que eu passei.
Mas a torre é uma obra de muito valor, tem um relógio que não há nenhum em Portugal, nem na Europa, feito nesse tempo, e hoje também já não há. Dá 1620 badaladas.