O número de colheres que faço por dia depende do tamanho da colher. Se forem colheres pequenas pode-se fazer mais alguma coisa, se forem grandes já se fazem menos. Passo horas e dias a fazer isto. De manhã é que se começa o dia e mal acordo vou logo fazer colheres. Quando começa o dia a escurecer, levo-as para casa. Faço serão e já fiz muitas colheres até à meia-noite, uma da manhã e às vezes até de madrugada. É o gosto pela profissão. Quando eu comecei a fazer colheres, não tinha luz em casa, era com um candeeiro a gás e às vezes a petróleo. Por isso é que eu agora já preciso de óculos para fazer as colheres. São muitas horas e cansa a vista.
Para fazer as colheres usava-se o serrote. Cortei muita madeira com o serrote mas agora é com a motosserra. São precisas quatro ferramentas para fazer as colheres: a machada que é para talhar; a enchó que é para tirar uma parte por dentro, para escavar que assim é melhor para fazer o acabamento; a legre é para fazer a concha da colher; e a faca. A madeira que se usa é de pinho e vou buscá-la ao pinhal. Dantes, com o serrote, tinham que ser duas pessoas uma de cada lado a cortar. A gente traz os rolos da madeira, estes são abertos aos bocados, racha-se e depois dali é que se começa.
Sempre gostei disto porque não sou como aquelas pessoas que se cansam de estar sempre a fazer o mesmo. Já me têm até dito isso, que não sabem como é que eu não me canso de estar sempre a fazer o mesmo, é preciso ter gosto para estar nisto. Enquanto estou a fazer as colheres, penso em fazer quanto mais melhor. A gente chega a um ponto que já não se aperfeiçoa mais.
Há sempre uma diferença de uns para os outros. Eu não vendo colheres para certos sítios mas se houver colheres minhas, por exemplo, em Lisboa ou noutro lado qualquer, eu conheço-as e conheço colheres de alguns colegas. A gente conhece o trabalho uns dos outros porque não há nenhum que trabalhe igual, tudo trabalha diferente. Isto não é feito à máquina e a gente às vezes vê o trabalho uns dos outros e conhece. Eu se encontrar uma colher no Algarve ou seja lá onde for, eu sou capaz de dizer assim:
- Esta colher foi feita por mim.
Agora já há poucos mas os poucos que há conheço-os. Os meus cunhados ensinei-os aos dois.