A sardinha vinha só uma vez por mês. Já não é minha lembrança porque eu já fui um bocado mais mimado. Mas vinha aí à Mourísia uma mulher da Moura vender sardinha. Até eram duas irmãs que aí vinham vender sardinha. Depois chegavam cá:
- “Compre-nos sardinha!”
- A minha mãe não tem cá dinheiro para comprar sardinha.
Chegava a ser 25 tostões, o quarteirão. Outros compravam meio cento e, às vezes, um cento.
Agarrava, entrava pela casa dentro, ia lá buscar o prato donde eles estavam. Tirava o prato, punha lá a sardinha e ia-se embora. A minha mãe:
- “Não há dinheiro, não há dinheiro.”
Era tudo na poupança. Não havia como hoje há. Mas naquele tempo era uma miséria. Não havia dinheiro. Era pouco, tudo era pouco. Mesmo para comprar.
Não é de minha lembrança, mas ouço contar os mais antigos que, antigamente, aquela sardinha maior, mais comprida, era uma sardinha partida para três.
Havia uma feira em Côja de mês a mês, havia outra em Avô e iam lá à feira. Traziam um cento de sardinha. Quando eram aí seis, sete pessoas. A sardinha traziam, comiam, depois agarravam, punham uns carquejos que há no mato, limpos. Punham aquilo numa vasilha, punham a sardinha por cima. Depois, outras agarravam, enfiavam um arame pelos olhos da sardinha e penduravam num arame a secar. A secar que era para a sardinha se não estragar. Porque a sardinha salgada aguentava-se. Só comíamos de feira a feira. E outros comiam a carne de porco que tinham. Eram tempos de miséria. Não comiam carne todos os dias, nem todas as refeições. Não havia bacalhau como hoje há. Isso era menos.