Há aí muitos moinhos na aldeia. Por ali abaixo, há uns 14 ou 15. Um fica lá em cima. Há outro que já só tem uma pedra. Os moinhos têm duas pedras. É a de baixo, a mais macia, e é a de cima que é para cortar o milho. Mas veio uma cheia há três anos que levou tudo quanto esteve aí na ribeira “pia baixo”. Levou tudo. E a ponte ia indo também.
Havia muita gente a moer na aldeia. Moíam todos. Faziam o pão como eu. Peneira-se a farinha, bota-se-lhe fermento, amassa-se e aquece-se o forno. Depois, a mulher tende-o e eu, com uma pá, enfio para dentro do forno e lá se coze. Mas aquilo não é muito fácil. Tem que se ir ao moinho. Tem que saber-se fazer a farinha. Não é de qualquer maneira. Depois, é peneirada com uma peneira que o meu pai fazia antigamente. Como fazia a joeira para joeirar o trigo e o milho, que é feita em arame.
É que aqui, antigamente, havia grandes lavouras de centeio. Eram feitas de nove em nove anos e tinham lavouras para todos os anos. Havia aí uma lavoura que dava mil alqueires de centeio. Era medida além naquela eira. Ali, malhou-se muito centeio. Às vezes, eram dez homens. Era meia-noite, uma hora e nós ali andávamos. Só quando começava a “pardejar”, a escurecer, é que começava o vento para o coar o centeio, para lhe tirar a munha.
Havia lá homens que tinham aos 120 alqueires de centeio e mais! E houve um ano que umas que eles aqui fizeram deram 150 alqueires! E isto tudo se vendia. Tudo se vendia! Se fosse hoje, era capaz de não vender. Vinham dali do Sobral Casegas, agora é Sobral de São Miguel. Carregavam, às vezes, aqui, quatro cargas de centeio. E milho? Ainda havia aí um sujeito que vendia uns 200, 300 alqueires de milho.
Quem dava um bocado de cultivo à terra era amigo. Andavam a cultivar terra a outro e ainda iam ajudar àquele e a quem precisava. Outras vezes, era a troco. Eu ia meio dia para um, outro vinha meio dia para mim. Iam ajudar uns aos outros. Quer-se dizer, era a troco, mas assim se fazia a agricultura.