Eu ainda escrevi algumas vezes, quando foi que andou a Guerra Colonial, em África. Era madrinha de guerra para ajudar a passar o tempo. Eu ainda escrevi para alguns porque outros que me conheciam davam os nomes. Eu escrevia desinteressadamente, qualquer coisa. Mas não por casamento. Depois alguns ainda quando regressaram até talvez pensassem mas eu disse não. Ser madrinha de guerra era para ajudar. Eles diziam:
- “Ajuda.”
Eu também lá trouxe um irmão meu e então quando escrevia para ele depois escrevia para os outros. Cheguei a escrever para três e quatro. Alguns até nem conhecia, porque eles davam os nomes das raparigas uns aos outros. E depois escreviam. Alguns até mandavam dizer o nome:
- “Se me quiser escrever ajuda a passar o tempo. A gente está aqui neste sítio, quando recebe uma carta...”
Pronto ficavam mais contentes. Se era só para ajudar a passar o tempo também não era por isso. Até havia aqueles aerogramas que não era preciso selo. Só comprava e escrevia, depois dobrava e mandava. Era barato. Púnhamos na caixa do correio, depois o carteiro quando vinha levava-os e quando eles vinham, vinham trazer à gente. O carteiro vinha todos os dias. Ainda vem.
O que se escreve para uma pessoa que está na guerra é consoante o que eles às vezes dizem. Não tenho ideia do que dizia para os animar porque uma coisa que realmente não é para fixar, eu esqueço. Aquilo que é para fixar eu fixo mas isso não tenho ideia. Talvez a animá-los, que tivessem coragem, que voltariam. Porque eles diziam que ouviam passar as balas, outros que viam os companheiros a ficar feridos. Dizia:
- Pode ser que não lhe aconteça. Vamos tendo esperança. Vamos ter calma porque nem todos lá ficam.
Pronto, palavras de animação. Que eu entendia que segundo a capacidade que tinha que podia dar alguma coragem, algum conforto, alguma esperança. Não lhe podia dizer:
- Olhe, pois é, o seu companheiro morreu, amanhã se calhar vai ser você.
Não podia dizer. A gente tem que dar sempre uma esperança, seja quem for. Mesmo que amanhã seja um dia pior, a gente tem que dizer que vai ser melhor. Se piorar, temos que ter paciência e enfrentar, ultrapassar.