Quando a minha mãe ia à feira, lembro-me que íamos com um candeeirito “pia além” ao cimo de Sobral Gordo, depois já se começava a ver, lá ia. E, às vezes, já iam pessoas de Sobral Gordo, iam pessoas de Sobral Magro, que não tinham medo. E, por vezes, ia com os ranchos, juntavam-se. Ia eu com a candeia e depois voltava para trás. Já se vendo, voltava para trás. Não havia lampião, havia quem tivesse mas nós não tínhamos. Era um candeeirelho e não se apagava, parece que era por Deus, e outras vezes, ela dizia:
- “Olha, há aí muito que fazer, eu vou.”
Lá escondia o candeeiro numa moiteira, numa coisa qualquer e no fim trazia-o. Custava muito naquele tempo. Nunca teve um abono para criar os filhos. Da feira de Avô trazia sempre muita sardinha, às vezes, bacalhau, daquele mais barato do que era nas lojas. Sabão era pesado, não queria trazer. Mercearia, uma massa grande, que ela trazia, chamavam massa capote, a gente tinha sempre muito comer, a minha mãe fazia um comer muito bom. Nunca se acabava. Trazia as coisas num saco. Não queria papéis. Ela despejava na balança, levava um saco, e depois virava e trazia o saco cheio. Chegava a casa, punha numa cesta. Era uma sopa com feijão, batata e depois punha muita massa. As sardinhas eram as que queria. A minha mãe não comprava da grande que o meu avô não gostava, e não era tão gostosa. Era da média. Mas chegava a casa e dizia, às vezes, assim para a gente:
- “Olha ide lá fritá-la!”
Nós atrás de uma, e outra, comíamos as que queríamos. E alguns tinham de dividir mas nós não. Em minha casa não. Faziam trabalhar muito a gente mas era sempre comer de fartura. Sempre. Também se comia batata, feijão, que era o que havia, castanha também. E matávamos, às vezes. Primeiro era só um porco mas depois chegáramos ao ponto de matarmos quatro. Quatro porcos. Só para casa. Mas também já estavam os meus irmãos em Lisboa. Também ia para uma parte para eles.