Criei seis filhos a cultivar terra, sozinha. Nessa altura, quase tudo se foi embora para ver se iam ganhar a vida melhor. Antigamente, quando começaram a ir os primeiros para Lisboa, diziam que andavam por lá a trabalhar nas novas quintas. Agora, cada um ia para donde podia. O meu marido ainda lá andou uns 18 anos. Andava a dar serventia na construção civil. Vinha cá de vez em quando, quando podia, mas lá tornava a voltar. Depois adoeceu e, claro, veio para casa.
Eu cá ficava a tratar dos filhos. Tinha de cultivar a fazenda por modos de dar renovo para eles comerem e de fazer a roupa para eles vestirem. Andei sempre no campo. Apanhei muito sol, muita chuva a roçar mato e cortar erva para os animais, a guardar o gado, a cavar terra para semear o centeio e a tratar fazenda. Nem era toda minha. Cultivava para mim e para os outros. Numa, cultivei 100 alqueires de milho, fiquei com 50. O outro era para o patrão. Não chegava o meu, cultivava doutros também.
Depois, as mais velhas já me ajudavam a fazer alguma coisa. Mas a gente na aldeia, quando era preciso, ajudávamos umas às outras. Eram amigas de ajudarem. Se estivesse uma pessoa doente, toda a gente ia ajudar. Iam semear o renovo, regá-lo, fazer o trabalhito que eles tinham para fazer. Depois, para colher para casa o renovo, também era preciso buscar carregos a este, carregos àquele para modos de ajudar.
Era muito diferente criar os filhos. Agora, claro, podemos ir pôr numa creche, para os pais trabalharem. Mas nós tínhamos de os levar para a fazenda para o pé da gente. Trazíamo-los lá no campo e eles lá andavam. Uma vez, eu andava a ralar o milho e a minha filha ia assim ao lado, à minha frente. E eu:
- Deixa-te estar aqui sentada.
Quando dei conta, vem ela muito depressa:
- “Ó mãe, eu também já sei arrancar milho!”
Arrancou um bocado de milho quase como uma mesa grande, assim tudo a eito. Mas, como ela via que eu que não arrancava o feijão, que só arrancava o milho, o feijão não me arrancou nem o primeiro. Nem lhe ralhei nem nada.
Criei-a ao pé de mim na fazenda. E os outros também. Não havia lá creche nenhuma, tinham de os levar para donde iam. Fraldas no meu tempo, não, senhor! Ainda não havia fraldas como agora. Nem quando me eu criei nem os meus filhos. Fazíamos as fraldas duns trapos das roupas da gente conforme podíamos. A chupeta, fazíamos, às vezes, umas rolhas de açúcar embrulhadas num pano. Quando eles se não calavam, embrulhávamos num pano, metíamos o açúcar dentro do pano e fazíamos assim a chucha. E, graças a Deus, criei os seis todos ao peito. Não foi preciso biberão.
Não fui para a maternidade. Nem nunca fui ao médico como andam agora. Tive-os em casa todos. Havia lá senhora, uma parteira. Era uma tia minha. Era Maria da Conceição. Não sei como ela aprendeu, mas lá se ajeitava. Era a parteira por lá do povo. É assim a vida. Graças a Deus.
Assim que se eles começaram a criar e puderam girar, cada um foi para seu lado. Começaram a sair, uns para um lado, outros para o outro. Saíram da escola, começaram logo servir. Um foi ali para Pomares com a idade de 14 anos. Outro foi para Lisboa, também com 14. E as minhas filhas, as duas mais novas, também. Mas foram guardar bebés a umas sobrinhas minhas. Uma sobrinha precisava lá duma para lhe criar o bebé, foi para lá, também. Outra esteve seis anos em Coimbra também a criar um. Depois, lá foi para Lisboa e agora está lá com uns patrões. As outras estão casadas. Já têm a vida delas. Agora, era só por telefonema que falava com eles. Só um é que agora está em Oliveira do Hospital.