Há aí muito moinho “pia fora”. Fui muita vez lá. Às vezes, o meu pai dizia-me assim:
- “Olha, arranja esta mão cheia de grão de milho e vais levar ao moinho. Eu ainda lá tenho muito milho, mas às vezes pode-se acabar.”
Eles não gostavam de trazer o moinho a andar sem o milho, porque faziam barulho. Ainda a gente ia longe já se ouvia. Eu ia lá, quando era para apanhar a farinha. Muitas vezes, a gente chegava lá e o que havia de apanhar a farinha, onde é que ele estava? Ainda estava na cama. Haviam de ir logo de manhã cedinho, mas não! Às vezes, já aí dava o sol quando lá apareciam. Quanto mais tempo andasse, mais milho lhe estava a moer. A gente não lhe mexia. Não é que desconfiassem, mas, depois, eu dizia assim:
- Então, quem é que me andou a mexer na farinha?
A gente esperava lá no moinho. Quando ela chegava, é que apanhava. Ao fim, a gente deitava-lhe o nosso milho e vínhamos todos para casa.
Os moinhos eram comunitários. Era meu e de mais três ou quatro pessoas. Eu tinha duas peças. Peças eram o dia e a noite. O dia era uma e a noite era outra. A gente não contava por horas, era duas, três, quatro peças. Às vezes, quando não precisavam de moer, pediam uns aos outros:
- “Olha, tens o moinho? Tens algum moinho? Se não precisas de moer, deixa-me moer a mim.”
Eu sabia quando era meu. Por exemplo, hoje era meu, amanhã era do vizinho, outro dia era do outro. Depois, voltava a ser meu outra vez. A gente já sabia que nesse dia ia ao moinho.
A gente tinha os porcos. Aos porcos a gente só lhe botava a ração, a farinha do milho. Moía e punha essa farinha para eles comerem.
Agora, estão a descansar. Não se mói nada. Deram-lhe a reforma, pronto. Estão reformados. Já não precisam de trabalhar, mas dantes, eram os moinhos todos a trabalhar aí por esse ribeiro acima...