Antigamente, a gente só comia daquilo que cultivava. Era o que dava a agricultura: hortaliça e batatas, milho, feijão, tudo. Tínhamos o queijo das cabras e também se criavam suínos. Então, matávamos porcos e comia-se a carne. Agora vem já do talho. Mas naquele tempo nem havia feira perto. Só iam às feiras para trazer peixe, pelo menos sardinha, carapau.
Também não vinha um padeiro vender pão, não havia. Era a gente que moía o milho e depois cozia-se a broa no forno. Começando lá em baixo no fundo da ribeira - chama-se a Foz d'Égua - até aqui ao cimo do povo, havia uns poucos de moinhos. E tudo moía! Tudo a moer toda a semana, de dia e de noite. Os moinhos eram para todos e toda a gente tinha uma peça. Hoje o dia e a noite eram meus. Amanhã, varria o moinho, era de outro. Tinha que se apanhar a farinha e limpar o moinho para o outro que vinha atrás. Mas está aqui um moinho em cima que era só do meu pai e de outro senhor, só deles os dois. Era um moinho de oito dias. Oito dias era quatro dias e quatro noites a cada um. Moíam eles metade e nós outra metade. Os moinhos da Foz d'Égua já não eram dos nossos, mas eu ainda fui lá. Como no Verão faltava a água aqui em cima, fui muita vez moer à Foz d'Égua, mesmo onde era a represa, onde vai juntar com a ribeira do Piódão. Estava lá um moinho. Não sei se a água o levou quando foi da enxurrada. Levou a ponte, acho que levou o moinho também. Depois cozíamos a broa. Andava o forno a quase semanas inteiras a cozer, porque havia muita gente. Estas terras que aqui se vêem estava tudo cultivado, tudo amanhado.