A casa dos meus pais não era como agora, com ouros e essas peças. Não. O açúcar era só quando estávamos muito doentes. Nem se tomava café de manhã como agora se faz. Era pão e comida caseira cá da zona. O pão era nosso, do milho que se cultivava. Moía-se, tínhamos na aldeia moinhos para moer. Tínhamos forno. Tínhamos tudo. Era tudo caseiro. Era tudo feito pelas nossas mãos. Chegámos a ser dez pessoas em casa. A minha avó materna ainda esteve alguns anos connosco. Morreu o meu avô, depois a minha mãe, era filha única, teve que se aguentar com ela. De maneira que chegámos a ser dez pessoas sentadas à mesa.
Trabalhava-se de dia, e à noite ia-se para casa fazer o que, naquele tempo, chamavam a ceia, ou seja, o jantar. Depois em casa dos meus pais havia um hábito, que já vinha da casa do pai do meu pai. Em casa do meu avô, nunca iam para a cama sem rezar o Terço em família. E de manhã, quando se levantavam, antes de saírem para o trabalho, ainda lá iam fazer uma oração qualquer à frente do crucifixo, que ofereciam o trabalho e o sacrifício de irem logo de manhã. Ainda sem passarem por eles, já ofereciam. Era um hábito. O meu pai ainda quis fazer o mesmo, mas depois começou a esquecer, a esquecer... Mas o Terço rezava-se em casa dos meus pais. Eram costumes que houve sempre enquanto eu estive em casa, até aos meus 22 anos. Mas antes dos 20 anos até pequeno, até me começar a lembrar de certas coisas passei por muitas.