“Ele dava porrada até mais não”

Eu cheguei a andar na escola uns dois, três meses. Aos 7 anos é que a gente ia para a escola. Era um professor. Até foi o primeiro professor que cá esteve e já estava há muitos anos. Era Alexandre. Ai Jesus! Ele dava porrada até mais não! Com uma régua que chamavam palmatória, dizia:

- “Deixa ver a mão!”

Pum! Era assim. Ele a mim nunca me chegou a bater, porque eu só andei lá três meses. Não teve tempo de me bater. Mas aos outros batia-lhe muito às vezes. E berrava muito com os miúdos. Às vezes, andavam lá daquele lado ao mato e até o ouviam a gritar com os miúdos. Eram muitos miúdos e depois o homem também se chateava. Tinha lá também dois filhos a estudar na escola. Então, ao fim batia nos miúdos e batia também nos filhos. Dizia:

- “Então, mas vocês pensais que só vós levais pancada? Os meus filhos também levam!”

E batia também nos filhos. Antigamente, a gente chegava à escola, aprendia a regra do “A”. Para ver a regra do “A”, havia uma pedra com um caixilho em volta. Chamavam aquilo uma pedra, mas era mesmo de pedra. Então, ele fazia-nos um risco com uma reguazita e dizia:

- “Vá, começa a fazer a regra do ”A“!”

Eles escrevia logo uma carreira a fazer a regra do “A” e a gente copiava por aquilo. Eu não sei nada, porque já não andei lá ao fim. Nem tinha livro nem sabia quase nada ainda. A minha mãe, coitadinha, queria comprar o livro e não sabia onde é que estava o dinheiro. Até fazia umas letritas, mas era pouco. Aqueles que aprenderam com ele fazem todos letra bonita, depressa e tudo. Mas ao fim ele foi-se embora. Só lá andei três meses. Depois já não tive mais escola. Havia muitas crianças. Quando andaram os meus filhos na escola, eram 60! Mas tivemos muito tempo sem cá ver a professora. Quando ao fim veio, eu já não era lá dada à escola, porque era só até aos 12 ou 13 anos. Já não tinha também idade para ir para a escola, já não fui. E depois também fazia falta à minha mãe para o trabalho. As contas e a tabuada ainda cheguei a aprender, mas foi ao fim com a minha irmã. Às vezes, à noite, a minha mãe dizia-lhe:

- “Ensina lá a tua irmã! Ensina-lhe alguma coisa!”

E ela ainda me ensinava assim algumas coisitas ao serão.