Às vezes lá ia brincar, mas a gente queria ir e a minha mãe não nos deixava ir para a rua. Dizia assim:
- “Ides lá para os outros fazer malandrices. Deixe-se aqui estar!”
Não nos deixava ir. Então, brincava com a minha irmã. Pois, brincávamos as duas. Mas, coitadinhas, a gente não tinha brinquedos como agora. Quer-se dizer, nós fazíamos, chamava a gente, às pedrinhas, ao jogo do botão... Mais de resto, tínhamos algum brinquedo como agora? Oh,oh! Brincávamos assim:
- “Vamos fazer à pina-malha!”
Então, escondíamos. Agora, os miúdos andam aí e dizem às escondidas:
- “Vou fazer às escondidas!”
Mas a gente chamávamos aquilo à pina-malha. Às pedrinhas era assim: juntávamos pedrinhas miudinhas, ao fim botavam-nas para a mão e depois apertávamos a mão. Diziam:
- “Quantas é que eu cá tenho?”
- “Tens tantas!” - dizia a outra.
E ao fim a gente abria a mão, tinha aquelas pedras. Ao fim dizia:
- “Olha, perdeste! Eu é que ganhei!”
Era assim as nossas brincadeiras. Mas, como estou a dizer, nunca tive um brinquedo. A minha mãe não tinha o dinheiro nem para nos vestir quanto mais para comprar brinquedos! Oh,oh! Ah, às vezes nós fazíamos bonecas de farrapos! Havia cá a minha tia e, como o meu tio era alfaiate, íamos-lhe lá pedir assim:
- “Dê-me um trapito! Dê-nos lá um farrapito!”
Era, às vezes, daqueles restos assim de retalhos. Lá juntava e dava-nos. Depois fazíamos-lhe a cabeça nuns trapitos. Dizíamos para a minha tia:
- Ó tia, faça lá a cabeça à menina!
Então, fazíamos assim: ela fazia-lhe o feitio da cabeça, atava-lhe uma linha - que ela tinha de nos dar as linhas e tudo - e depois lá adiante enrolávamos uns trapos em volta. Faziam-lhe assim um feitio, um lencinho, e ficava sempre à frente com um bocado sem nada. Dizíamos que era a cara. E, pronto, já era uma boneca! É para ver como é! Se fosse, como agora, brinquedos para cima de brinquedos.... Mas eles já nem os querem tão-pouco!