Em casa dos meus tios, morreu o filho com 16 anos. Foi umas penas aqui na povoação. A maior parte da terra vestiu-se de luto por ele. Depois os miúdos iam lá para casa deles. De manhã, ainda estavam os meus tios na cama, que às vezes, de noite, deitavam-se tarde porque estavam a trabalhar, já nós estávamos na porta!
- “Tia Maria Rosa, abra-nos a porta!”
Os pais iam lá pô-los à porta. Deixavam lá os maiorzitos mas, às vezes, também lá deixavam ficar dentro do berço os pequeninos. Ao fim, já se sabe, faziam chichi, faziam tudo. A minha tia, coitadinha, é que tinha aquela paciência toda de limpar os meninos. Deixavam lá com aquelas fraldas, porque não usavam cuecas como agora. Era sem cuecas. Depois, quando faziam cocó, tinha que os levar. Era uma chatice para ela, coitadinha, porque tinha tanto que fazer de alfaiate. O que é, às vezes, havia muita gente a ajudar-lhe no trabalho de fora, assim do campo. Também só o trabalho que ela tinha com aqueles miúdos... É que juntavam-se lá até aos 40 e 50! O meu tio, de Inverno, tinha uma braseira com carvão (que mandavam um rapaz ou um homem fazer). Estava sempre a braseira acesa. Então, os miúdos bulhavam e brigavam uns com os outros, porque todos queriam estar ao pé da braseira. Como não podia estar tudo ao pé da braseira, porque era só uma, batiam-se uns aos outros lá em casa dela e tudo. Nessa altura, a gente chamava uns pastores que iam botar as cabras. Depois, quando vinham, às vezes, vinham todos molhados e cheios de frio. Se havia de ir para casa deles tirar aquele fatinho que se tinha molhado, ia mas era para casa da tia Maria Rosa! Coitadinhos, não tinham nada para vestir... Chegavam lá e o meu tio fazia assim para os miúdos:
- “Agora, desviai para trás, que vós já cá estais há muito tempo! Deixai aquecer esses! Esses vêm todos gelados com frio.”
Mas eles estava sentados no chão, porque ela não tinha bancos para todos. Tornavam-se assim um bocadinho para trás, tornavam a fazer, mas ficavam-se na mesma, coitados. Então, o meu tio tinha que pôr mais carvão na braseira para ter onde os pastores se enxugarem. Enxugavam assim a roupita lá em volta da braseira.