O meu pai era António Paulo Fontinha. Ele era pedreiro nas Minas da Panasqueira. A minha mãe era Maria dos Anjos e era empregada doméstica.
O meu pai trabalhava nas Minas da Panasqueira. Era uma coisa muito horrível. Deslocar-se da Covita para tão longe. Quantas vezes chegava a casa, já descalço porque não podia aguentar o calçado. O calçado antigamente era diferente de agora. O meu pai vinha ao fim-de-semana, ao sábado e ia embora ao domingo. Levava qualquer coisa que cá tivéssemos. Pão de milho, queijo, carne, feijão verde, hortaliça, levava o que se arranjava. Na altura era o que havia. Ao domingo à tarde, levávamos à serra as coisas dele, que era para aliviar mais, para não ir tão carregado até às minas. Era assim.
Eu fui às Minas da Panasqueira uma única vez porque eu era a mais nova dos irmãos. Era pequena, por isso eram as minhas irmãs que lá iam. Quando lá fui vi onde ele dormia. Ia lá lavar a roupa da cama. A outra roupa trazia e levava depois. Trazia uma e para a outra semana levava a outra. E a roupa da cama, a gente ia lá lavá-la, para a ribeira. Ficávamos de um dia para o outro. Normalmente ia a minha mãe mais a minha irmã. Mas eu gostava de lá ir. Lavavam a roupa e eu como ainda era miúda, andava na escola, pedia à senhora professora para me dispensar para ir com elas. Eu andava lá na brincadeira na ribeira e elas estavam a lavar a roupa.
Aquilo era um bocado complicado. O meu pai aleijou-se, fracturou sete costelas. Esteve nove meses internado, no Hospital da Barroca Grande. Iam lá visitá-lo mas era muito longe. Iam a pé. Tinham de ir de noite e chegar aqui de noite. Eu nem lá fui, que eu era pequenita. Era muito tempo. Eu sei lá quantas horas é que levava. Descia a serra de cima, de Chãs d'Égua, passava-se aí, ultrapassavam para a outra parte. Desciam aquela encosta toda direitos à ribeira, subiam outra vez para cima e estavam na Panasqueira. Sei lá, umas duas ou três horas de caminho.
A minha mãe trabalhava na agricultura e a minha avó é que tratava de nós. A minha avó estava mais em casa, então era ela que tratava do comer e que reparava por nós. A minha mãe andava mais por fora, a trabalhar no campo. Cultivava milho, batatas, feijão, alface, pimentos, cebolas, alhos, tudo da casa, muitas coisas. Porque não havia onde comprar as coisas como agora. Não havia estrada, não havia nada. Muitas coisas agora aqui não se cultivam porque a gente sai e traz as coisas. É diferente.