Andei sempre por aqui mas, em vindo a parte do Verão, andava lá por fora. A minha mulher, coitada, dizia:
- “Ó Artur, nunca mais cá chegas!”
Mas eu dizia-lhe: em tal dia lá vou ter a casa. Assim foi. Fartava-me de andar aí a pé, credo! Agora já há estradas, mas, naquele tempo, não havia estradas, era tudo a pé. Uma vez, em Maio, quando estava para lá, fui com tempo bonzinho, mas vim para cá a apanhar uma nevada lá em cima, no alto. Ai! Quem é que chegava à minha casinha? Havia sítios onde me enterrava na neve. Disse:
- Ora eu, ora eu! Ai que morro sem chegar a ver a minha mulher.
Depois enterrava-me naqueles buracos fundos e não sabia o caminho. E eu para andar lá ia eu aos tombos! Ai Deus... Mas lá vim devagar. Aquilo era para o lado de Porto da Balsa, das Minas da Panasqueira, para aqueles lados dali. Aí, como andavam naquelas Minas, havia bom dinheiro. Nunca estava sem o ordenado. O que eu levava davam-me logo de boa vontade e ainda diziam por cima:
- “Obrigadinha, ó senhor Artur! Muito obrigadinha de nos cá vir arranjar os moinhos!”
Pagavam-me bem. Nunca estavam a chatear a cabeça e até me davam gorjeta! Naquela altura, o dinheiro era pouco, mas ainda havia boa gente que me davam belas gorjetas. Era boa gentinha por ali. Graças a Deus, não tenho que dizer. Com a graça de Deus, tudo se passa.