Tradições cá, há poucas. A gente aqui é do trabalho para casa e pouco mais.
Antigamente eram festas mais bonitas que agora, porque havia muita gente. Agora também há gente, muita gente, só que ficam a ver. Mas antigamente aquilo era espectacular! Íamos todos. Os homens levavam umas opas, uns coisos brancos vestidos. As mulheres era com uns véus pretos pela cabeça, que antigamente usavam. Chamavam Irmandade. Agora não se usa nada aquilo. Cada um vai de qualquer maneira e feitio. Mas antigamente era assim. A gente não podia ir em mangas de camisa para a missa, que o padre descascava-nos depois. E agora vai-se de manga curta, vai-se de calções, vai-se coiso, mas antigamente não podia ser.
A festa começava com a missa. Depois, a meio da tarde, faziam o leilão. Era garrafas de vinho, queijo, que antigamente aqui havia muito queijo, outras levavam aguardente, mel, medronho e azeite. E, então, aquilo era ao despique. Um oferecia 5 e eu oferecia mais 5, bota para ali 10, outro 15, outro 20... Por exemplo, quem tinha muito queijo, agarrava, levava um ou dois. A malta sabia que aquilo era queijo bom, então, lá lhe picavam. Chegava-se a pontos que até as ofertas dos meus cunhados chegavam aí aos 60 contos por queijo! Depois, porque era queijo dos meus cunhados, eu ia e picava-o também. Era assim que arranjavam ali uns 300 e 400 contos só no leilão. O dinheiro era para depois a Comissão fazer melhoramentos, para a água, para manutenção dos tanques. Era assim que funcionava.
À noite era arraial até umas tantas da manhã. Nessa altura, o padre proibia os arraiais. Depois começaram a fazer um dia para a Igreja, que ainda hoje é, e os outros dois dias era da Comissão. Só naquele dia é que não havia baile. Mais os outros dias havia. Há os bailes e depois a malta andava aí a comer e a beber. Havia sempre bifanas, caracóis... E, durante a noite, aquilo era comer e beber até andarmos meios zonzos. E então o caminho “pia baixo” já não nos metia medo! Aquilo era a direito! Muitas vezes vinha lá do Chãs d'Égua para baixo às três, quatro horas da manhã. Aquilo era por um caminho, não era pela estrada como agora. Aqui caía, ali me levantava e lá vinha. Às vezes, chegávamos a casa todos rasgados. Depois a minha mãe chateava-me a cabeça.