A gente matava sempre um porquito todos os anos. Era em Janeiro, Dezembro, Fevereiro, quando ia o tempo mais fresco, por causa da mosca. Durante o dia, quando a carne do porco estava pendurada a escorrer podia-se, às vezes, pôr lá uma mosca e depois estragava a carne. Um porquito que tinha que dar para todo o ano era o nosso conduto. Não era como agora, não íamos aí aos supermercados.
A matança era uma festa! A gente, de manhã, matávamos. O nosso trabalho era chamuscá-lo, rapá-lo, lavá-lo, pendurá-lo e abri-lo. Punham logo o sangue a cozer num caldeiro grande. Aí, quando o pendurávamos, antes de o abrirem, era logo queijo fresco e sangue cozido com um dentinho de alho. Aquilo era uma categoria para beber uma pinga. Então, era as mulheres - chamavam elas - a estremar as tripas das banhas. E depois iam lavá-las à ribeira. Quando vinham de lá para cima, é que faziam os torresmos para a gente comer e elas também. Ao meio-dia, era o almoço. Era logo carne do porco. À noite, tornava-se a desmanchar o porco e era cortar febras para o lume. Assávamos um bocado de carne. Era a minha mãe a cortar para as chouriças e eu a tirá-las! “Pumba”, para as brasas e vai ele comer! E ela dizia:
- “Ah sim!? Come-la aqui assada, depois já não comes as tuas chouriças lá de cima!”
E eu:
- Vamos lá ver chegar!
Era uma festa toda a noite. Às vezes, tínhamos enchido ainda do ano passado e também era tradição comer sempre um bocado do enchido do porco do outro ano antes. A gente ainda tínhamos acabado de comer, mas comíamos na mesma. Aquilo era um estômago que era uma máquina! Comíamos que eu sei lá o quê. Comia-se e bebia-se mais uns copos e assim acabava a matança do porco.
Depois, ao outro dia, é que se cortava a carne para o enchido e salgava-se. A carne era para o ano todo. Agora é arcas frigoríficas. Aqui, antigamente, era no sal que a gente curtia a carne. E, então, a do sal era boa e mais saudável que a de agora. Salgávamos os presuntos, púnhamos ao fumo e íamos cortando dali.