Tinham os moinhos. Iam ao moinho moer o milho. Havia muitos moinhos. Uns eram de meias, outros eram de três, quatro pessoas, outros eram só de uma pessoa. Hoje acho que só há aí um ou dois moinhos a trabalhar, mas antes havia vários. Agora vai um moer, amanhã vai outro, logo vai outro. Cada um por sua vez. Nesse aspecto sabiam que eram dessas pessoas. Por exemplo, a levada para regarem os terrenos, ainda hoje há uma levada comunitária e cada um sabe que eu quero regar, outro quer regar e esperam uns pelos outros. Cada um rega a seguir uns aos outros.
Lembra-me e sei fazer broa. De vez em quando ainda faço. Ora é assim: peneira-se a farinha de milho para uma bacia, um alguidar ou uma gamela. Antigamente era só naquelas gamelas de madeira. Tenho uma preta. Essas é que são lindas e aqui não encontram mais nenhuma. Depois punha-se água morna para dentro. Mexia-se bem. Punha-se uma porção de farinha de milho, uma de centeio e uma de trigo e então o fermento necessário para a levedura da massa. Amassava-se aquilo bem amassado então punha-se a repousar que era para ela crescer. Tapava-se com uma manta. Havia pessoas que diziam que pondo umas calças com a braguilha das calças dos homens em cima da manta que estava a cobrir a broa, que levedava mais depressa. Ou então pôr uma faca de aço debaixo da bacia em que estava a levedar a massa. Deixava-se estar aí duas horas, conforme ela ia crescendo. Acendia-se o forno. Quando se vê que a massa está lêveda limpa-se o forno, bem limpinho e então começa-se a cortar a massa para dentro de uma escudela. É o nome que tem. Põe-se com a mão para dentro daquela escudela, um bocadinho de farinha na escudela, põe-se a massa e depois batia-se para a broa ficar redondinha. Está uma pessoa a segurar a pá do forno, põe um bocadinho de farinha na pá do forno que é para não agarrar a broa. Depois a pessoa mete para dentro do forno. Quatro, cinco ou seis broas que dê. Há pessoas que deixam ficar um bocado de massa na gamela, ainda hoje eu gosto muito, fazem um picado com bastante cebola e azeite e bacalhau desfiado e depois fazem um bolo de cebola. Pode ser de chouriço e carne. Há também quem faça com sardinha. Mas temos que ter aquela cebola picadinha, com bastante azeite com um bocadinho de pimenta e depois juntar aquilo tudo ao resto da massa. Põe-se também na pá do forno, mete-se dentro do forno. Mas essa é uma coisa que se tem de bater com a pá do forno que é para ele ficar baixinho, aí com 2 centímetros. Se ficar como a broa já não é bom. Tem que se bater dentro do forno com a pá que é para ele não crescer. Então faz-se aquele bolo, come-se quente que é de comer e chorar por mais. É pena não vir agora um bocadinho. Que é muito bom. Há bolo de sardinha, de carne e de bacalhau. Geralmente toda a gente que cozia a broa, no fim fazia sempre um bolo que era uma refeição. Um prato de sopa e um bolo daqueles. Aquilo fica uma coisa grande, dava para três, quatro pessoas. Ainda hoje se faz isso. As poucas pessoas que ainda cozem, ainda fazem muito o bolo de cebola, de sardinha ou de bacalhau. O meu genro acende o forno, coze a broa e faz os bolos para comer. A minha filha quando chega a casa tem os bolos. Às vezes quando lá estou ainda ajudo.
Havia aí muitos fornos, hoje já não. Eu na altura não tinha. Tenho agora, mas foi desde que mudei, porque eu morava noutro sítio. Por exemplo, havia uma pessoa que tinha um forno, ia outra vizinha pedir e ela deixava lá ir cozer a broa. Às vezes, até se juntavam duas pessoas ou três e coziam todas de uma vez. Em casa dos meus pais, por exemplo, no meu bairro só havia um forno que era o dos meus pais e toda a vizinhança ia ali cozer o pão. Nós éramos miúdos e gostávamos muito. Estávamos ali ao pé das velhas, ouvíamos histórias antigas e estávamos ali na conversa. Às vezes, quando dava para noite, então no inverno, uma pessoa queria estar ao quente e então estava a ouvir. O bairro todo ia cozer a broa no forno dos meus pais.