A gente aqui, ainda há bem pouco tempo, fazia a matança tradicional no largo de Chãs d'Égua. Fazíamos o magusto de São Martinho, as festas anuais, o Natal e, na altura da Páscoa, fazíamos uma festa da matança do porco. As pessoas, os antigos, vinham todos de Lisboa. O meu primo, que era o presidente da Direcção, matava o porco. Depois, faziam-se lá as febras e aquilo tudo. Assisti a essa recriação da matança antiga. Assisti a várias.
Há um banco em madeira, uma coisa robusta. Vai-se buscar o animal, que não quer vir. Uns puxam, outros empurram. Têm que o prender ao banco com outra corda. Aquilo impressiona muito, porque o animal guincha como uma pessoa. Parece uma pessoa a ser torturada. Realmente, impressiona muito. Depois, vai-se lá com a faca. O porco está de costas, tem as patas para cima. A faca tem que ir direito ao coração sem tocar na traqueia. Aparava-se o sangue e põem para uma bacia para fazer um arroz de cabidela. Aquilo tem técnica e preceito. À noite faziam o petisco. A gordura que traz junto ao intestino mais aqueles miúdos que tiram do porco é tudo frito na altura. Juntam-se ali todos. No outro dia, na festa, come-se a carne do porco que se matou.
As pessoas daqui participavam. Era a União Progressiva, isto é, a Comissão de Melhoramentos que tentava manter as pessoas unidas através da tradição da matança do porco. Já há muitos anos, que as pessoas deixaram de ter porco. Foram envelhecendo. Aquilo dá muito trabalho e deixaram de ter porcos. Agora, já deixaram de fazer a matança. É mais fino. Mandam vir um assador, que traz o porco morto. Metem-no num espeto e estão a rodá-lo e a fatiá-lo. É fatiado e cortado.