Lembro-me de o meu pai trabalhar em Lisboa como operário. A memória aí, enfim... Tenho algumas ideias, mas não me recordo. A única coisa de que tenho memória é de uma greve que houve. A própria Carris fez greve e, na altura, os estaleiros também. Recordo-me que aquele pessoal das docas, tudo fez greve. Ele também foi lá no molho dos grevistas. Como compensação disso, passado um dia ou dois, veio a polícia e levou-o. Esteve 15 dias numa prisão. Metiam aquilo tudo nas cavalariças e nas cocheiras. Ficou a minha mãe a sustentar os filhos todos. A gente sem saber dele. Depois, voltou a reingressar na CUF, por causa da minha mãe. Ela contava, às vezes, essa história. O meu pai não gostava muito. Havia um senhor, que passava ali na rua onde nós morávamos. Era o Dr. não sei quê. Uma pessoa calma e tal. Na altura, não havia carros, não havia nada. Era nos eléctricos ou a pé. Ela foi ter com ele, comigo ao colo, e pediu-lhe. A pessoa emocionou-se e arranjou-lhe trabalho. Era a altura do regime antigo. Quem fazia greve, era vermelho. O meu pai era um bocado vermelho, era sim, senhor. Eu não sou. Não sou anticomunista, mas também não sou comunista. Ele e a minha irmã eram. Mas lá o Alfredo da Silva dizia:
- “Não, eu não quero cá sapateiros nas minhas máquinas! Eu quero cá operários bons!”
Então, acho que ainda teve algumas pegas com o poder político para readmitir aqueles que a polícia política tinha dito:
-“Este é vermelho. Não tem trabalho.”
Era uma discriminação.