Com 19 quase 20 anos, fui à Inspecção militar, em Arganil. Depois fui chamado para ir um ano para a tropa. Estive um tempo sem ser chamado e só fui para a tropa em 1953. Nessa altura, já tinha se calhar 22 anos. Cumpri o serviço militar durante 18 meses e saí em 1954. Foi no ano em que a minha mãe morreu. Ainda andava na tropa. Estava na minha companhia de Armas Pesadas do Regimento da Infantaria 12. O dia-a-dia na tropa era difícil. A gente tinha que passar por baixo de arame farpado. Logo de manhã, fazer ginástica, estivesse a chover ou estivesse como estivesse, tinha de ser. Depois subia cordas, saltava poços de um lado para o outro, galgava muros. Era muito difícil. No entanto, eu ainda me lembro que me dei com um oficial muito bom. Ele era dos lados do Fundão, um Aspirante. Tinha bom coração. Se a gente teimasse que não saltava ele até deixava a gente de lado. Tapava os olhos. Uma vez fui saltar uns muros, bati com uma perna e aleijei-me e ele nunca mais me obrigou a saltar muros. Era muito bonzinho. O melhor que havia no quartel. Todos falavam no Aspirante. Ainda me lembro do nome dele, Jorge. Nessa altura, só eu e um primo meu, que já morreu, também de Soito de Ruiva, é que fomos para a tropa. Às vezes, íamos e vínhamos juntos, mas ele vinha mais vezes à terra do que eu. Até podia vir mais vezes, mas eu é que não quis desde que a minha mãe faleceu. Ficava no quartel a fazer serviço de outros que tinham dispensas ao fim-de-semana. Sempre ganhava algum dinheiro. Davam às vezes sete mil e quinhentos escudos por fazer uma faxina por outro. E em lugar de vir à aldeia e como já não tinha que ajudar a minha mãe, acanhava com mais serviço. Na altura só tinha cá o meu pai. A roupa era eu que a lavava. Depois tinha que a pôr ao sol e ficar ao pé dela. O que é que se fazia para modo de a enxugar? A gente esticava as calças e ponha debaixo do colchão, mesmo molhadas, porque não queria deixar lá fora, pois podiam roubar. Chegava a noite e a gente tinha que a arrecadar a roupa tal como estava. Ao meter na arca a roupa que a gente tinha que engomar, metia debaixo da roupazita da cama e ficava engomada. Nunca fui castigado por ter a roupa suja ou por causa de um botão. Nunca cheguei à porta de armas para sair e me dissessem assim: - “Não pode sair.” Alguns diziam para outros: - “Falta aqui um botão. Tens que ir fazer aqui isto, fazer aquilo.” Nunca fui castigado. Não trouxe da tropa más recordações. Aliás, a tropa foi uma boa escola. Mas era uma tragédia. Roubavam muito. Ainda passei lá um bocado difícil. Para dizer a verdade, assim que juráramos bandeira já não havia tropa. E a partir daí foi mais fácil. A recruta foi a fase mais difícil. Em passando a recruta já não nos mandavam fazer nada. A gente até se fartava e se aborrecia com muito boa vida. Não fazia nada, nadinha. Não me chamavam para nada. Em Julho os soldados foram chamados para a manobra de Santa Margarida e não fui. Fui nomeado para ir para Quartel-General em Coimbra. Aí então é que entrava à hora que queria. Na altura em que me chamaram para ir para o Quartel-General, tive que ir a pé, que remédio, e demorei muito tempo. Quando lá cheguei não tinha nada para fazer porque fui dos últimos a apresentar-me. Além disso, havia os impedidos, que eram os primeiros que se apresentam no Quartel-General e eram escolhidos para estarem às ordens dos oficiais. Cada oficial tinha um soldado para fazer o que mandava. Tinha que estar às ordens deles. Por isso, chamam-se de impedidos. Eu como fui dos últimos fiquei para a faxina. Não fazia nada. Aquilo até aborrecia de tanta boa vida. Os colegas eram bons. Às vezes, lavavam a loiça e era tudo mais rápido para terminar o serviço. Em Outubro de 1954 acabei o serviço militar. Nessa altura ainda não namorava com a minha mulher. Depois vim para Soito da Ruiva, onde estive uns mezitos. Só depois é que fui para Lisboa.