Havia muitas pessoas que tinham mel. Eu, quando o meu marido ainda podia, também tinha ali uns cortiços. Na nossa terra, estava o limite tapado de mato-branco e negro. Há mato-branco, com a flor branca, e há mato que fica tudo rosa, muito lindo, que é o chamado mato preto. A gente chamava o mato negro e o mato-branco. E havia muitas flores e muitas queirós. Quando o mato “frole”, as abelhas arranjavam o mantimento para fabricarem o mel da mongariça, que vem mato-branco. O mel que vem da queirós era mais mole e mais branco. Se fosse de mato negro o mel era mais escuro e mais gostoso. Agora já não há, ardeu tudo. Tive uma colmeia, a que a gente chama os cortiços, que deu quatro litros de mel num ano. A gente punha o cortiço - até trouxe um cortiço da Piedade, já com um enxame dentro - e elas andavam a arranjar o mel por fora. Era preciso que a mestra estivesse dentro do cortiço. Quando um enxame entra num cortiço, tem que se espreitar se a mestra lá vai ou não. Se a mestra lá for, o enxame vai e faz lá a casa. Se a mestra não for, o enxame torna a sair, foge e vai-se embora. Porque não está lá a mestra para fabricar. A mestra é a que fabrica o mel e é quem dirige as outras abelhas que levam o pólen nas patitas. A mestra é comprida e maior que as outras que são pequeninas. Se saltasse para lá um bicho que chamam a barroa, que é um bicho do feitio das borboletas, cortava as asinhas todas às abelhas e o enxame morria, porque não podia voar para ir buscar o pó. Quem tinha os seus cortiços ia vendo se tinha a barroa. Até havia um produto para curar. O dono é que tinha que lá pôr uns preparos para as abelhas não morrerem. Os cortiços eram de cortiça dos sobreiros. Agora são umas casinhas de madeira, mas dantes não era disso. Eram quatro cortiços, que faziam quatro esquinas. Chamavam àquilo uns viros. Punham-se uns coisos compridos que faziam com uns espetos de ferro quentes na cortiça, para aquele pauzito entrar para prender as partes da cortiça. E punham a tampa de cortiça por cima. E por cima da tampa punha-se uma laje grande para quando chovia as abelhas não se molharem. Uma vez por ano, em Julho, mandava-se crestar. Arrancavam ou tapavam o cortiço e davam fumo às abelhas para fugirem, senão mordiam as pessoas. E então, a pessoa que estava a crestar, com uma crestadeira, que é um ferro para baixo que tem o feitio duma colher, tirava o mel para um balde ou para um alguidar. A gente chamava um senhor para as crestar, uma pessoa que soubesse. Então, crestava e tirava o mel. Aquilo era aos favos. Se na altura de Julho não lho tirarem, elas comem-no e o dono fica sem nada. Mas tinham que lá deixar uma parte para elas. Era o alimento delas até voltar outro ano com as flores para tornarem a fabricar mais mel. Não lho podiam tirar todo, senão morriam. Depois, de crestar, chegava-se a casa e espremia-os. Ficava o mel limpinho. Colocava-se em frascos. Com o tempo ficava uma cera por cima do mel dos frascos. A gente tirava-lhe aquele selo para o mel ficar limpo. O mel era para vender. Não fazíamos doces com mel. Mas havia muita gente que fazia aguardente de mel ou que gastava o que era preciso para as constipações ou quando às vezes vinham pessoas sempre davam um frasco a um e outro. Também se comia com broa. Era o conduto. Era bom, ai não, que não era! Hoje já não tenho, mas até gostava muito. Agora todos os anos compro. Para mim não que sou diabética, mas para os meus filhos todos os anos compro, porque onde vivem há mel, mas não é nada como o nosso. O nosso é simples. Há pessoas que põem misturas no mel. Uns põem açúcar para abundar mais, para venderem para dar mais litros e outros põem farinha. A gente precisa de saber a quem compra. Se o mel é simples, tem um gosto e tem uma cor. Se o mel tem misturas, tem outra cor.