Lembro-me de ver a minha mãe fazer broa. Hoje, a gente até diz que é passar a farinha. Mas a minha mãe não dizia que era passar a farinha, dizia que era peneirar a farinha. Depois de peneirar, punha o sal. Naquele tempo tiravam o fermento porque não havia como agora. Era diferente. Guardavam um bocadinho daquela massa lêveda, punham numa tigela e guardavam-na para quando voltassem outra vez a fazer o pão. Agora, por acaso, não faço assim. Raras vezes cozo, mas ainda faço broa. Já não é preciso cozer duas vezes numa semana. Compro fermento, à noite aqueço uma cafeteira ou um tacho com água no fogão e desfaço aquele bocadinho de fermento. Ponho lá e amasso um bocadinho daquela massa no alguidar onde hei-de fazer o pão. No outro dia aquele fermento está todo lêvedo. Depois amasso o pão, vai-se aquecer o forno e tende-se. Isso é difícil! Tender o pão é difícil. A broa da minha mãe podia ir de qualquer maneira que ficava sempre bem! Ela só lhe dava ali meia volta, “bumba”, e punha-a logo na pá para ir ao forno. Nunca fui capaz de fazer isso e já me custa mais um pouco. Eu tenho tendido muito pão, mas já não tenho aquela prática como ela tinha. E a minha filha ainda é pior do que eu! Esta que morreu é que sabia muito bem, até sabia melhor do que eu, ainda pequenina e sabia muito bem. Agora já há aí muitos fornos, mas naquele tempo apenas havia um forno para a povoação. Um ou dois, mas só me lembro de um. Havia aí mais, mas era só de um dono e, no outro, havia mais pessoas ligadas. Depois, cada um tinha a sua semana e a gente se queria cozer o pão tinha que ir pedir vez à pessoa a quem estava entregue o forno naquela semana. Uma vez a minha mãe cozeu broa em sociedade com outra senhora. A minha mãe deitou o pão - a gente dizia que era tender o pão - e aquela outra senhora, coitadinha, esqueceu-se de por sinal no pão e o pôs todo dentro. Faziam um sinal no pão. Umas faziam com um dedo - ficava um buraquinho -, outras punham uma caruma, mas não era toda por igual, claro! E a mulher, coitadinha, quando deu que a minha mãe já tinha posto o pão todo no forno, disse: - “Ó Assunção, olha que não fiz sinal na broa! Mas, ó Assunção, deixa lá que a tua conhece-se da minha.” A broa da minha mãe ficava sempre um bom pão. Por isso é que a gente a comia depressa. A minha mãe era uma pessoa que tudo o que fazia era bem feito. - “Ó Assunção, não te arrelies que a tua conhece-se da minha.”