O meu avô Manuel António João uma vez foi para a Covilhã ou para a Bairrada, já não sei bem para onde. Ele andava nos negócios dos bois e quando lá chegou tocaram para a missa e o meu avô, que era muito religioso, foi para a missa. No átrio da igreja, ele estava com dois bezerros e prendeu-os numa árvore e também foi à missa. Quando estava a sair, disseram-lhe: - “Se calhar até já nem valia a pena ir à feira.” E depois: - “Quanto é que quer pelos bezerros?” - “Quero tanto!” Lá fez o negócio e vendeu-os. Vendeu-os logo! Ganhou! Eram reais ou o que era, eu não sei como era naquele tempo. Ainda davam uns vinténs, então, vendeu-o. Depois chegou ao pé dos outros, que iam de Soito da Ruiva também e não quiseram ir à missa nem tinham feito negócio nenhum. Aí eles juntavam o dinheiro. Depois diz um assim: - “Não valeu a pena a gente cá vir! Uma caminhada como a gente fez e não se fez negócio!” Atravessavam estas serras todas a pé. Diz ele assim: - “Vocês ainda não fizeram negócio nenhum! Eu já comprei uns bois e já os vendi outra vez!” - “O quê! Não pode ser! Então tu foste para a missa?” - “Foi mesmo no largo da igreja.” Ele depois ainda fez lá mais um negócio. À volta, havia um sítio onde costumavam ficar e, na altura, andavam por ali uns gatunos, que de noite apanhavam toda a gente. O meu avô ficou para trás a falar com uma gente e os outros foram andando. Ao fim, vinha sozinho, mas já a contar com os gatunos. Usava aqueles paus antigos que quando batiam no chão, saía aquela parte em cima e ficava o espeto. Há um que se lhe atravessou à frente e disse: - “Dá-me aí dinheiro para a pinga!” E o meu avô respondeu: - “Ao que vocês andam também eu ando!” O gatuno foi para se botar ao meu avô e ele “tuca” - espetou-lhe! E ao fim disse-lhe: - “Este já está, se houver mais algum pode vir!” Jamais! Os outros só se viam a fugir pelo meio do mato fora, com medo do meu avô. Depois acontece que o meu avô pensou: - “Eu agora já sei. Com certeza que eles andam lá para me apanhar.” Ainda assim, o meu avô foi para a taberna ter com os amigos, onde comeram, beberam e quando foram para pagar, diz assim um da taberna: - “Vocês não pagam nada. Está tudo pago!” - “Quem é que pagou?” - “Olhe lá, você deu conta de um, pois apareceu morto. Olhe que já cá não andam gatunos agora. Desapareceu tudo! Por isso...”