O limite da aldeia era todo semeado de centeio. Quer-se dizer, por partes. Um ano era num lado, outro ano era noutro, outro ano era noutro, até que chegava ao fim. Isto demorava mais ou menos nove anos a dar a volta ao limite a semear o centeio. Depois tornava a ir ao princípio, até para o mato e a giesta se criar. O mato e a giesta eram cortados, o terreno cavava-se e era enchido com adubo, como cá diziam antigamente. Depois aquilo era queimado e depois semeava-se o centeio. No ano a seguir, nessa parte já não levava nada. Era para tornar a criar mato para, no fim de nove anos, tornar a semear o centeio. Depois eles punham, às vezes, mais centeio do que milho. A batata só era semeada debaixo da Oliveira, senão não dava nada. Eles queriam era o grão do milho e o feijão. Plantavam o feijão, que até crescia à volta do milho. Diziam que para a batata era mal empregado o terreno e tudo mais. Houve um ano que o meu pai, que Deus tem, um bocado chateado com as minhas sobrinhas, dessa minha irmã que morreu, semeou batatas. Houve aí uma outra pessoa que não conhecia também e disse-lhe: - “Ó Alberto, não achas mal empregado aquele bocado semeado de batata? Aquilo é bom para o milho!” - “Se é bom para o milho, também é bom para as batatas! Foi a resposta que o meu pai deu. Quando foi ao fim arrancar as batatas, havia lá 18 carretos de batatas. E milho, se eles lá trouxessem um alqueire de milho ou dois era muito. E depois diz o outro: - ”Tu é que tinhas razão. Agora tens lá um forte de batatas e eu se as quero comer, não as tenho lá.“ Na altura para cavar terra eram só homens. Mas depois chegou ao ponto que eram quase só as mulheres que cavavam, já que os homens tinham ido para Lisboa. E para amanhar os terrenos tinham que ir elas cavá-los. Hoje, isto dá mais produção, porque antigamente não se curava nada. Hoje se não se cura nada, não se tem nada! Nós tínhamos um bocadito de feijão. Dava para todo ano e tudo mais. Mas nós hoje não semeamos a décima parte do que semeávamos e o feijão dá à mesma. O problema é que tem que se andar sempre com a máquina às costas! Havia também muitas árvores de fruto. Cerejeiras eram o que havia mais! Ao cimo da minha fazenda, tinha algumas quatro ou cinco. Hoje não há lá nenhuma, que arderam todas. Mas próximo aos moinhos tem lá dois bocaditos, no de baixo não tem nada, mas no de cima tinha lá uma ou duas cerejeiras. Ao pé da levada que vem para a minha fazenda ainda tinha outra. Hoje já não há lá mais nenhuma também. Tinha escapado uma do outro incêndio, mas o último fogo acabou por deitá-la abaixo. Primeiro, os moinhos não eram ali, ficavam mais abaixo. Eram e são moinhos de água. O primeiro que existiu é o que chamam o moinho do Tapado. Depois surgiram os outros todos. Moíam de noite e, de dia, andavam a regar no moinho. Há cá catorze moinhos, mas em bom estado só lá estão dois porque eu os arranjei. Eu é que arranjei os moinhos! Fui eu que fiz o rodízio e os pus a moer! Mas nunca me pagaram nada! Lá têm as outras coisas. Enquanto não pagarem... Era o que faltava, também! Eu fartar-me de trabalhar e não me darem nada! Para o de cima, para fazer o rodízio, tive que comprar um castanheiro e dei 100 contos por ele! É muito dinheiro que se gasta! E mesmo o rodízio do moinho, nem todos os fazem! É preciso ter força também. Já os outros, está tudo... Está ali um que fiz há pouco tempo, porque ardeu. Eu disse o seguinte: - Bem tenho que deixar maior, porque vale mais ser maior do que mais pequeno. Depois quando lá cheguei tive que cortar aquele bocado. Mas já moeu. Havia muitas famílias a viver aqui na aldeia. Isto chegou a estar tudo povoado. Eu vivia daquele lado. A minha irmã vive lá em cima. Ela também viveu ali, quando casou. A minha avó vivia na outra casa de baixo. Havia aí casas de cinco e seis pessoas. E oito! E toda a gente trabalhava. Isto não é da minha lembrança mas ouvia a minha avó dizer muitas vezes que o meu avô ia para a ceifa, não sei para onde. E aí havia o cunhado, chamavam-lhe o Manuel José, que levou um filho que casou com uma tia minha que era avó da Ana Maria. Pois, a avó dela era irmã da minha mãe. Ele chamava-se José Maria, irmão da avó da minha mulher. Depois o tio Manuel José levou o outro Zé Maria, ainda ele era pequeno. Quando lá andavam na ceifa havia - chamavam lá - os manajeiros, que eram aqueles que andavam a tomar conta do pessoal, mas também andavam a ceifar igual a eles.