Havia cá dois barbeiros que sabiam como os médicos. Um era José Maria. Vivia ali ao fundo do café. Aprendeu a dar injecções e certas coisas que fazia. Ao outro chamávamos José Augusto “Linhaça”. Um dia, o meu sogro foi ao barbeiro para arrancar um dente:
- “Olhe, ó tio Zé Maria, vinha aqui para me tirar este dente.”
Arrancou-lhe o que estava bom e o que estava podre ficou. Depois teve que lá voltar outra vez:
- “Ó tio Zé Maria, então o dente está-me a doer tanto!”
- “Então, já to arranquei.”
- “Ah, você arrancou-me o que estava bom e o que estava mau ficou.”
Mas aquele senhor que se chamava José Augusto era um bom parteiro. As mulheres não iam agora para Coimbra para ter um filho. Elas alcançavam e depois era até ao dia de ter o filho sem ter uma consultazinha. E, graças a Deus, tudo corria bem.
Eu parti uma perna tinha 5 anos. Nós até vivíamos aqui em baixo, ao fundo, onde foi a loja do comércio. Em brincadeira, pus a vassoura entre as pernas e ia assim a andar “pia cima”. Depois, a fugir de um cavalo, tombei para o lado, parti uma perna. Não havia cá médicos. Veio cá um doutor - vivia aqui em Côja - chamado doutor Alberto, mas quem me arranjou a perna foi um barbeiro. Ele sabia muito bem. Tinha muita prática a arranjar pernas e braços. O doutor Alberto confiou nesse barbeiro, que nem foi ver a perna. Daí por um mês, pus-me a andar. Ainda era novita. O que é estive um mês deitada com um aparelho de madeira na perna. Lavavam-me e vestiam-me na cama, que eu não podia. Os braços, mexia bem, mas a perna não. E, graças a Deus, fiquei bem. Já parti a perna, já parti outra vez a perna, parti a clavícula, parti um braço, já parti muita coisa. Mas, desde que vim de África, onde parti a clavícula e o braço, nunca mais fui a um médico. Há dias fui tomar a vacina contra o tétano, porque disseram:
- “Ai, tens de ir, tens de ir que é obrigatório!”
Mas, graças a Deus, tenho 80 anos, nunca mais tomei um comprimido, nunca fui ao médico.