Ainda lá fui agora há uns cinco anos. Corri a Baixa toda e aquilo ainda estava tudo na mesma. Disse para o meu filho:
- Ó Berto, então mas isto agora ainda está na mesma?
Disse assim:
- “E aqui não arranjam.”
A Baixa de Lisboa está sempre na mesma. Podem dar uma limpeza, mas não arranjam. Depois, quis lá ficar e ele disse-me para mim:
- “Você não fica aqui nada! Você vai já embora! Vai já embora comigo, porque você daqui a bocado até sem a roupa fica! Roubam-lhe a roupa, roubam-lhe tudo e você fica aí nu! Fica sem nada!” - dizia ele para mim.
Aquilo lá em Lisboa está um caso sério. Agora roubam lá uma pessoa com uma coisa desgraçada. Não é como no tempo do Salazar. No tempo do Salazar, era muito diferente. Agora, a guarda, a polícia, as polícias prendem-nos, ao outro dia já estão cá fora. Não adianta nada. O Salazar não deixava lá estar ninguém. Uns iam para a cadeia, para a esquadra, outros levavam não sei para onde. Uma pessoa se lá não trabalhasse, naquele tempo, se lá estivesse assentado num jardim, chegava lá o polícia, ia logo verificar se ele tinha documentos e adonde é que trabalhava ou não trabalhava. Se não trabalhasse, levavam uma pessoa. Agora, não. Agora, dormem na rua. Naquele tempo, não dormia ninguém na rua. Aquilo é uma miséria, agora. Está muito diferente.