Depois de casada, foi trabalhar na fazenda e os filhos ao colo. Seis filhos é difícil. Na fazenda fazia tudo. O fazer tudo era carregar a terra do fundo da parede para o cimo à cabeça, cavar a terra, espalhar a semente e enterrá-la. Íamos, esterroávamos a terra, como nós chamamos. E depois a ralar, sachar, empalhar e regar. Fazia-se tudo. Cortar a bandeira, desfolhar e apanhar o milho, era assim a nossa vida. Cultivava tudo. Batatas, feijão, milho, plantava cebolo e tratava das cebolas, pimentos, tomates... Tudo o que cá há para comer. Fazíamos vinho e aguardente. Temos vinha. São pequenas, mas temos muitas videiras nos cômoros. Fazíamos corrimões. Tínhamos muita fazenda. Agora está tudo relva.
Usávamos enxadas, sacholas, ancinhos, pás, quando era para fazer as poças: botava-se um pau numa ribeira, encostava-se-lhe umas pedras, botava-se-lhe umas leivas e vedava a água. Era fazer as poças para regar. Não tínhamos máquinas. A nossa fazenda não era de máquinas nem de poços nem de nada. Era águas entancadas e regávamos.
Para adubar a terra, era a borralha da fogueira. Era o nosso adubo. Em primeiro. Quando apareceu o adubo, dava-se-lhe um bocado de adubo. Era melhor. A borralha era um pouco mais fraca.
De princípio, nem pesticidas havia. Não se curavam as árvores, não se curavam as videiras. Eu já me lembra. Nada disso. Agora é que nem com curar, às vezes, as coisas se criam muito bem. Agora, a batata semeia-se, adubos para cima. Ela está a nascer, lá vem o escaravelho, mais produto para cima. Vem o sol e vem a chuva e não sei quê, lá vem mais sulfato para cima. Tiram-se, lá vem a borboleta, mais pó para cima. Mais pó para elas não colherem os grelos. O quê? A batata é o pior veneno que se pode comer. Botam-lhe venenos desde que se semeiam até ir para a panela. No meu tempo, não era assim. Semeavam-se com borralha e não se curavam. As coisas criavam-se melhor que agora. Agora, tem mais produção, mas primeiro, criavam-se com muito menos veneno
O que criávamos lá ia, às vezes, um saco. Ou se vendia ou se dava como assim ainda hoje se dá. Hoje não vendo, mas dar ainda dou batata e feijão, que é a única coisa que agora cultivo. Milho já só para casa. Mas primeiro até vendia de tudo, que era o nosso rendimento. Vinham pessoas lá à terra e eram pessoas lá da terra, que levavam. Estavam em Lisboa, vinham cá e compravam. Eram uns litros de aguardente, eram uns litros de vinho. Era umas batatas e uns feijões. E assim íamos vivendo.