Depois, casámos. O casamento foi ali em baixo na igreja. Foi o senhor padre Loureiro. Um bom padre, coitado. Um dia:
- “Ó Adelino, ande cá beber uma bebidazinha.”
Fazia umas bebidas à maneira dele. E como eu sou assim para as caldeiradas e tudo... Era um padre porreiro. Chega-me à sacristia, para me confessar:
- “Sabe, o casamento é uma carta fechada. É bem que se dêem bem... Tens que ver bem...” - e assim e assado.
Um bom padre, coitado. Um padre muito porreiro. Dava bons conselhos. Não esteve lá com ladainhas... “É uma carta fechada, é bom que se dêem bem...” Um bom padre.
Eu ia bonito! Ia bem vestido! Parecia um engenheiro hidráulico! Deu um postal bonito! Mandei fazer o fato em Lisboa. À maneira, todo à maneira. Depois, vendi-o a um preto lá na África do Sul. Não sei se também se casou com ele, se não. Eu engordei lá um pouco e ficou um bocado acanhado. A comida é esta coisa. Vendi-o ao preto. Foi todo contente.
A minha mulher ia toda morenita. Ainda levava o ramo da laranjeira. Ia com a virgindade. Agora, virgindade, não há nada. É o que a outra disse do azeite: “que é da virgindade?” Não há!
Lá no Lidl, eu andava no azeite e andava lá uma pequena minha conhecida:
- Olha que azeite, até tem um raminho. Este ainda tem a virgindade, é como a rapariga solteira...
- “Está bem, está! Que é delas agora?” - disse a rapariga.
Ela gosta muito da paródia. Falo-lhe sempre. Vê-me, falo sempre. Ela disse:
- “Que é disso agora?”
Comecei na brincadeira:
- Olha a virgindade. É a virgindade. O raminho bonito. Há lá azeite.
E ela disse:
- “Que é da virgindade? Já não há virgindade!”
A festa foi aqui em baixo, na casa dela. Fizemos o jantar. Matou-se - ainda me recordo - um carneiro, que custou 500 paus. Parecia uma vitela. Era um carneirão! Nunca mais me esqueceu. Dei 500 paus pelo carneiro. Aqui há tempos, disse o Armindo, já faleceu:
- “Onde é que o comprou?”
Parecia uma vitela! Era aqueles jantares. Umas senhoras, as cozinheiras, ajudaram. A tia Aida, a tia Celeste... Era sempre aquelas mulheres. Na altura, sabiam fazer boa comida. Havia aí umas cozinheiras, que faziam boa comida, organizavam aqueles jantares. Matavam as ovelhas, matavam os carneiros, matavam as galinhas caseiras - não havia galinhas do aviário, não havia nada -, matavam tudo, depois faziam aquela comida. Era à maneira. Não é como hoje que vão comer aos restaurantes. Que é do dinheiro dos restaurantes? O dinheiro era para comprar o fato do casamento. Tanto se poupava, poupava... Ainda hoje, não há para poupar. Para a roupa arranjei dinheiro e para o resto para a comida também se arranjou, olha que poça! Adeus para tudo! A malta não foi com fome e bebeu também. Depois, até houve luta que eles beberam demais. Até se zangaram. Eram 50 convidados. Davam uns copos, umas mantas, umas coisas. Não achei dinheiro. Que é do dinheiro? Era escasso. É como é hoje? Não havia dinheiro para parvoeira. Onde é que havia para parvoeira? Vá lá que lá vá...
A vida é assim. Fomos lá viver para baixo e daí a um tempo, fui-me outra vez para Lisboa. Ela ficou aqui sozinha alguns dois anos ou três. A vida era vir um bocado. Era assim. Hoje, vão uns atrás logo dos outros. Atrás de carro e dois. Como eles vieram, praticamente. Ela depois lá foi para passar comigo o Natal ou o que foi. Isto é um paraíso hoje. E pronto. Calhámos, cá estamos. Ela não está aborrecida comigo, eu também não estou com ela. Eu já lhe disse:
- Olha, estás mal, vai-te embora! Se queres-te ir embora, vai.
Ela não quer ir. E ela diz que eu que deixe e que vá eu, pronto. Eu não quero ir, deixa-me estar com ela. Portanto, vamos estando bem. Vamo-nos dando e Deus queira que muitos anos. É assim a vida.