Na casa da malta, quem trabalhava nas garagens e os empregados do comércio não trabalhavam todos os fins-de-semana. Muitos tinham folgas. Então aos domingos juntávamo-nos e íamos vender com cestos. Mas só aos domingos porque o sábado era o dia em que chegávamos mais tarde a casa. Chamavam aqueles cestos de figo, uns cestos fundos. Enchia o cesto, que era de um rapaz do Valado que tinha mais o negócio, ia lá a esse para a vender. Se eu fosse comprar às casas que tinham aquilo que era o António Brás e Brás, que era na Praça da Figueira, o Brás e Brás, na Travessa São Domingos e o António Brás que era na Rua da Palma, eles vendiam mais caro. Então aquele rapaz como só negociava naquilo, era a vida dele, forneciam-nos mais em conta. Aos fins-de-semana ia lá com o cesto e eles davam-nos caixas de palitos, colheres de pau, almofarizes, martelos para os bifes e cortadores de massa tenra. Depois ia aos domingos, pelos prédios por ali acima. Começava nas avenidas, ia até ao Areeiro, Avenida Guerra Junqueiro, subia pelas escadas acima, batia às portas:
- Oh minha senhora não quer isto?
Lá lhe começava a explicar.
- “Ai não quero nada disso.”
- Ó minha senhora nem com uma caixa de palitos me fica? Fique ao menos com uma caixa de palitos!
Quando era o tempo dos morangos, era os morangos que ia vender. Também pelos prédios acima a apregoar o morango, que era de Sintra e Colares. Havia uns pregões muito bons. Havia um rapaz, que até está em Arganil, que apregoava muito bem o morango. Mas eu também apregoava muito bem:
- Olha o morango, é de Sintra, é de Sintra e de Colares!
- Olha o cabaz com morangos e é barato!
- Olha o cabaz com morangos!
Mas havia aí rapazes que apregoavam melhor do que eu.