Fui à escola. Era aqui na aldeia. Depois fizeram uma nova. Tinha aquelas cadeirazitas corridas de antigamente. E sentávamo-nos ali. Eu devia ter aí uns 7 ou 8 anos quando entrei. Nesse tempo, a primeira coisa que a professora nos dizia era:
- “Vocês conhecem estes senhores que estão aqui e ali?”
Era o Salazar e o Carmona. A primeira coisa que eles ensinavam à gente era isso. Os que deixaram uma manada de analfabetos no nosso país. Já naquele tempo o meia-tigela ficava num lado e os outros com a tigela cheia ficavam noutras cadeiras, mais perto da professora. Já havia disso, antigamente. Houve sempre, mas naquele tempo era pior. As professoras conheciam as pessoas da povoação. Elas moravam cá. Sabiam bem quem eram os pobres e os outros. E tratavam-nos de maneira diferente. De que maneira! Aqueles que podiam, lá davam o presentezito para lhe adoçar a boca. Os pobres não podiam, não lhe davam nada e já se sabe como é que era. Ainda hoje existe isso, quanto mais naquele tempo.
Não me lembro do nome das professoras. Vieram para aí uma data delas. Já lá vai há tanto ano que agora não sei o nome delas. Mas naquele tempo ensinavam bem. E não se podia brincar com elas! Elas arriavam na gente! Não é como agora que não se pode bater num aluno. Os alunos é que batem nos professores! Naquele tempo era ao contrário.
Eu ainda levei com a régua, com aquela palmatória furada, que elas tinham. Levei com ela na mão uma vez. Um rapazinho - um amigo que foi para Lisboa - foi “arrear o calhau” de baixo da janela da casa onde ela morava. Depois, foram-lhe dizer que tinha sido eu. E eu é que roí à rica e à francesa. É verdade.
Andei na escola pouco tempo. Fiz a primeira classezita à pressa, depois comecei a trabalhar e fui-me embora daqui.