Eu brincava mais com o meu irmão António mas éramos todos uns traquinas. Quando nos portávamos mal ou fazíamos alguma travessura e o meu pai estava em casa, não levávamos porradita, mas quando ele não estava a minha mãe dava-nos. O meu pai punha-nos sempre muito “o braço por cima”, como a gente costuma dizer, não deixava dar. Tanto eu como os meus irmãos nunca tivemos o hábito de andar por aí a saltar para ir roubar uvas ali ou uma maçã acolá. Embora, nessas alturas, se fizessem muito essas coisas nós nunca tivemos esse hábito.
Há um episódio que ainda hoje me recorda. Já lá vão muitos anos. Naquela altura era tudo cultivado, isto que se vê agora não tem nada do que era. Havia milho, feijão e batata pelos campos fora. Quando era miúdo, quando acabava o período da escola, eu ia para os ninhos com mais uns dois ou três rapazes, mais ou menos da minha idade, pelas barrocas abaixo. Um dia andávamos aos ninhos numa cova e acontece que sai um gado, umas cabras e ovelhas, de um curral e andavam na rua a comer o milho que lá havia, as canas do milho ainda verde. Ora como nós andávamos aos ninhos eu fui culpado de ter ido destrancar o curral e levei uma grande carga de porrada da minha mãe e era inocente. É este o episódio de miúdo que mais me lembra e que mais me marca, porque eu não tinha culpa nenhuma. Cheguei a dizer a essa senhora antes dela morrer, que eu não tinha feito aquilo, nem nenhum dos que lá andavam tinham feito. Aquilo deve ter sido alguma carga de marrada na porta e a tranca saltou fora e elas vieram para a rua.